Paulo Nogueira Batista, vice president of the New Development Bank |
He sees highly polarized populations in Europe, as well as in the Middle East, Latin America and the United States.
In the developed world the polarization is a reaction to neoliberal globalisation, he observes. And in the US a man like Trump would not have been chosen in more normal circumstances.
So we are living in exceptional times. Do you agree?
Polarização
No Brasil, estamos vivendo regressão fenomenal em termos políticos, institucionais, e até em termos de comportamento
Não sei se os brasileiros se dão conta, mas vários dos nossos problemas estão ocorrendo simultaneamente em diferentes partes do mundo. A crise não é só nossa. Se isso for verdade, ficamos, por um lado, psicologicamente reconfortados. Mas, por outro lado, é mais difícil sair do pântano, uma vez que os problemas econômicos e políticos de outros países rebatem sobre o Brasil, dificultando a superação da nossa crise.
Um traço da crise atual é a polarização da sociedade em vários países ou regiões — EUA, Reino Unido, Europa continental, Turquia, Brasil, Venezuela, por exemplo. Nem falo das guerras civis e da desordem no Oriente Médio — Síria, Líbia, Iraque, Iêmen. Nos países desenvolvidos, a polarização representa uma reação à chamada globalização neoliberal, ou seja, a rejeição do projeto socioeconômico das elites internacionalizadas.
No Brasil, o caso é diferente — o que tivemos, e temos ainda, é a rebelião das elites e da maior parte da classe média contra determinado projeto político e social, que prevaleceu no Brasil de 2003 até 2014. Não pretendo discutir hoje se a rejeição ou rebelião se justifica ou não. Mas queria destacar o quadro de crescente polarização que atinge até mesmo um país como o Brasil, que se notabilizava pela sua capacidade de conciliar divergências.
Nem sempre se observa, leitor, que nas eleições e referendos dos últimos meses a margem das vitórias foi quase sempre pequena. Parece um padrão: Brexit (sair 52%, ficar 48%), eleição de Donald Trump (por 47% a 48% no voto popular — vitória no colégio eleitoral), eleição na Áustria (vitória do candidato verde por 54% contra os 46% do candidato de um partido de extrema-direita).
No Brasil, em 2014, Dilma Rousseff se reelegeu por margem também estreita (52% contra 48%), indicando já então a divisão da sociedade, que seria agravada nos anos seguintes pela campanha pelo impeachment e seus desdobramentos. A exceção foi o referendo na Itália, do- mingo passado, em que a derrota do governo foi por quase 60% a 41%, levando à renúncia do primeiro-ministro do Partido Democrático, de centro-esquerda.
Outro aspecto notável: a disposição do eleitorado de optar por caminhos arriscados. Na Itália parlamentarista, por exemplo, estava claro que a derrota do governo levaria à queda do gabinete e, portanto, a nova eleição, em que a direita nacionalista tem, ao que parece, grande chances de vencer. O Brexit era uma aposta de alto risco para o Reino Unido, como se vê pelas dificuldades que a saída da União Europeia acarreta e continuará a acarretar.
Nos EUA, em situação mais normal, dificilmente um Trump conseguiria se eleger presidente — ou mesmo chegar a ser candidato por um dos dois principais partidos. No Brasil, grande parte da classe média saiu às ruas para pedir a derrubada da presidente eleita, ignorando ou desprezando os vários tipos de riscos que o impeachment estava tendo e continuaria a ter para o país. A violência crescente da disputa política é mais um aspecto que salta aos olhos.
No Brasil, estamos vivendo regressão fenomenal em termos políticos, institucionais, e até em termos de comportamento. Mas não só aqui: a regressão é evidente também nos EUA — muito antes da eleição de novembro — e na Europa onde o projeto “iluminista” de integração regional profunda patina há vários anos, e entrou agora em crise talvez terminal. O espaço acabou. Tento retomar noutra ocasião.
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